sábado, 4 de julho de 2009

Funerais

Nos velórios e funerais toda a gente desespera por ter uma tarefa, já repararam? Aquele silêncio, as lágrimas, o morto ali desconfortavelmente no meio, as lembranças, as pessoas de preto. É tudo demasiado insuportável e especialmente incómodo. Então as pessoas dedicam-se às pequenas tarefas, quase que lutam por elas. Ir buscar lenços, comprar qualquer coisa para comer (as vezes que foram necessárias, para quantas pessoas for preciso), ir buscar mais uma cadeira, trazer um casaco. É bom ter à mão uma maquininha estragada também, de prefêrencia de outra pessoa. A haste de uns óculos que saiu de sítio, um telemóvel que não recebe mensagens. Tudo para sermos úteis.
E quando essa possibilidade escasseia, fala-se aprofundadamente de coisas insignificantes. Como o trânsito que se encontrou até chegar à casa funerária, das novas obras na estrada que complicam mais os acessos, dos autocarros que são uma vergonha e nunca chegam a horas. Até dos próprios serviços funerários.
Nos funerais ansiamos por coisas que nos distraiam do morto. E principalmente dos enlutados. Porque a dor deles torna-nos impotentes. E porque muitos, como eu, não sabem lidar com isso. Não conseguem dizer "os meus sentimentos" e não choram em público.
Sempre que vou a um velório acho que sou uma pessoa insensível.

5 comentários:

Fátima disse...

Tenho exactamente o mesmo problema. Não consigo dizer "os meus sentimentos" porque, de facto, não estou a sentir. Não da mesma maneira que os enlutados...sinto-me a intrometer-me numa coisa que não me pertence, na vida privada...

mchiavegatto disse...

Lol... Mas ja foste assim a tantos velorios pra teres um teoria sobre isso?
Bah.
Eu nao. Acho que so fui uma vez e nao pretendo repetir mtas mais.

i disse...

fui a alguns... não muitos, uns quatro ou cinco. alguns de pessoas bem próximas e mesmo assim não sai a dita frase, mas não é por não sentir. não sei porque é

Francisco Maia disse...

é ridículo a quantidade de funerais a que já fui...

o meu grupo de amigos tem a tradição de se deslocar em peso para o velório cada vez que um parente de um membro do grupo morre. Somos trinta, é fazer as contas.

Ainda por cima puxam-me sempre com aquela do "não é pela avó dele, é por ele..."

Mas sim, percebo perfeitamente o que escreveste. é o equivalente à palavra "amo-te". em português soa tão mal: "os meus sentimentos" "lamento" "as minhas condolências" "os meus pêsames" bah

SA disse...

Comigo parece que quando as pessoas são próximas é mais difícil... Já chorei num velório, pq as palavras (súplicas) da mãe da minha prima me comoveram... mto!

Em relação a pessoas menos próximas, torna-se menos difícil, as palavras saem com mais facilidade. Fico sempre com a sensação que não vou conseguir dzr nada, mas depois lá surge qualquer coisa!

Quando o meu avô morreu, os meus pais quiseram que eu telefonasse à minha avó... aí sim, senti-me uma perfeita anormal. Fiquei com um nó na garganta, não disse nada ao telefone para não desatar num pranto... eu tinha 14 anos... enfim...