Oz. Como o feiticeiro, como a Dorothy de sapatos vermelhos, como essas coisas mais ou menos de encantar. Certo? Errado. Oz é o diminutivo de Oswald State Correctional Facility, uma prisão de alta segurança que é cenário das seis temporadas da série televisiva, a primeira com episódios de uma hora que a HBO produziu.
A relação com o filme de fantasia existe, de facto, apesar de nunca ser mencionada. É com ironia que sobre esta prisão se diz “It’s no place like home”, brincando com a frase que popularizou o Feiticeiro “There’s no place like home”. Humor negro, é seguro dizer.
Na Oz do pequeno ecrã também há uma Emerald City mas não tem uma estrada de tijolos amarelos. É sim, uma unidade experimental dentro da prisão, delineada pelo idealista Tim MacManus, que coloca o enfoque na reabilitação dos prisioneiros em lugar do castigo.
O plano tem tudo para funcionar, especialmente quando se fala de ficção. A unidade é mantida imaculada, os reclusos debaixo de olho 24 horas por dia. Há acompanhamento psicológico, médico e espiritual.
No entanto, M-City, como os seus habitantes lhe chamam, não é diferente de qualquer outro inferno na terra. Há droga, sexo, corrupção e muita, muita violência.
“Oz” não é uma série para os habituais consumidores de acção. Não é uma “Prision Break” disfarçada, não tem heróis encartados e a moral da história perde-se a casa episódio. Em Oz não há moral.
Não há um prisioneiro bonzinho, detido injustamente. Bom, exagero. Sim, a esmagadora maioria da população desta unidade é composta por monstros. Homens que mataram – e não para defender donzelas em apuros –, que violaram, torturaram, raptaram, agrediram. São autores de crimes violentíssimos e pouco ou nada justificáveis. Ainda assim, no meio do caos, a humanidade emerge.
Há claro, prisioneiros mais simpáticos. Tobias Beecher é o melhor deles todos. Foi preso por atropelar fatalmente uma menina quando conduzia alcoolizado. O remorso mata-o. Mas isso não o impede de matar o filho adolescente de outro prisioneiro. Justiça lhe seja feita: o pai do tal adolescente, um nazi da pior espécie, já havia mandado assassinar o filho de Beecher, uma criança com não mais de sete ou oito anos.
Depois há Kareem Saïd, um exemplo de rectidão e o líder dos muçulmanos da prisão – em Oz todos pertencem a um gang: os negros, os latinos, os italianos, os homossexuais, os motoqueiros e os muçulmanos. Mas também Saïd luta com a sua consciência e, a certa altura, cede às tentações da ira e da vingança.
O grande fascínio de “Oz” consiste na complexidade das personagens e na imprevisibilidade da história. Para uma produção de 56 episódios, de uma hora cada, todos passados numa só unidade prisional, o ritmo é alucinante. E nós, os telespectadores, sofremos verdadeiramente com o que se passa em M-City. Sofremos e odiamo-nos por isso. Porque um dia o filho recém-nascido do Miguel Alvarez morre e ele chora a sua perda – e nós com ele – e no outro agarra numa navalha e arranca os olhos de um guarda.
Em “Oz” somos constantemente confrontados com a humanidade das personagens. Essa humanidade tão real, tão fora das séries televisivas, em que as pessoas são más, muito más e boas ao mesmo tempo. Em que odeiam os outros, os filhos dos outros, as mães, os pais, os irmãos. Querem-nos mortos e matam-nos. E ainda assim nós sofremos por eles, pela vida que arriscam diariamente, por aquilo de mais vergonhoso que vemos de nós próprios neles.
Um conselho de quem está a um episódio do fim: não se apeguem às personagens. Entre as dezenas que ocupam aquelas celas só há oito que chegam até ao fim. O conselho, claro, será em vão. A cada goela cortada, cara queimada, peito esfaqueado e pescoço estrangulado – eu podia continuar mas acho que percebem a ideia – o espectador sofre. Mas pior que isso: rapidamente começa a arquitectar, do conforto do seu sofá, como e de quem virá o seguinte golpe de vingança.
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