domingo, 28 de dezembro de 2008

A questão que já todos pusemos

"Que importância se dá em Portugal ao bem estar, à qualidade de vida, a uma coisa tão simples como o conforto? Posso responder: todos os dias passa aqui na rua a minha vizinha aposentada, solitária, que se desloca com a ajuda de duas muletas, penosamente evitando os carros — muitas vezes o meu — estacionados em cima dos passeios do bairro. Poderia ser a outra vizinha com o carrinho de bébé, ou um deficiente. Como querem que não sejamos infelizes se somos um país desconfortável, mal planeado, pouco cuidado?

Em finais dos anos 90 ia todas as semanas à aldeia dos meus pais um professor de pintura. Os velhotes encontravam-se, faziam exposições, — estavam felizes. Mas isso era evidentemente um luxo, uma loucura “guterrista”, uma fantasia capaz de nos levar à falência (como dez estádios de futebol? ou como salvar bancos de investimento?). Não, não podemos. Em Portugal o que é civilizado é deixar os velhos abandonados e desocupados no fim das suas vidas.

Em Portugal, dizem-nos, não há dinheiro para os grandes projectos. Então e os pequenos projectos — arranjar as calçadas, cuidar dos jardins, melhorar o transporte urbano, pintar prédios, cuidar de aldeias, criar bibliotecas, manter museus abertos, fazer desporto amador, pôr creches no local de trabalho? Sim, eu sei. É tudo poesia. Peço desculpa por falar nisto."

Rui Tavares

1 comentário:

Fátima disse...

pois! muito forte. ainda há pouco tempo falámos dos jardins da minha aldeia, muito bonitos em comparação com o lar, que não está em grande estado. enfim...