domingo, 30 de outubro de 2011
Portas, janelas e afins
quarta-feira, 26 de outubro de 2011
Às cinco da manhã
terça-feira, 25 de outubro de 2011
domingo, 23 de outubro de 2011
"Isto é surreal!"
quinta-feira, 20 de outubro de 2011
quarta-feira, 19 de outubro de 2011
domingo, 16 de outubro de 2011
Passos em volta: Alguém que guie
Metade da magia de uma viagem é o caminho que se faz até chegar ao destino. Seguindo na Rua do Campo, já depois do McDonalds – esse marco do património –, um mural lembra-nos da necessidade de procurar a luz. Afinal, quantos de nós podem dizer que não buscam direcção?
O caminho faz-se caminhando e, de subida em subida, mapa já fechado e nariz no ar, o turista procura um ponto na paisagem. De passagem vê vestígios de uma cidade que conserva uma fé eternamente misteriosa aos olhos que vêm de fora. O incenso sempre queima, o vermelho sempre impera e as estatuetas sentadas em flores de lótus mantêm o sorriso de mona lisa. Aqui, onde o consumo dita o mote, onde a arte mais querida é a de apostar, os vestígios de uma espiritualidade enigmática merecem fotografia.
Click. Sobe as escadas. Mais um click e estamos no jardim, mais outro e já guardámos na máquina as velhotas que conspiram à sombra e as crianças que observam adultos a dançar com espadas.
Turista que é turista, mesmo na sua cidade, compra bilhete de teleférico. A subida, ainda que compartilhada com um apaixonado casal de namorados, conserva algum encanto de antecipação – afinal, a luz já deve estar perto.
Depois vem a parte melhor: a certeza que em minutos veremos aquilo que a vegetação esconde, aquilo que se lê nos livros e se avista em pequenino lá de baixo, da Praça do Tap Seac. As placas verdes indicam a direcção. Um click aqui, mais outro ali, que os prédios e avenidas já se vêem pequeninos e o Grand Lisboa parece de brincar.
Chegamos. O casal de namorados passeia, aponta para a paisagem, faz pose para o iPhone. Lança-nos um sorriso de reconhecimento. Também eles vieram à procura da Guia.
Depois de atravessar os túneis com maquinaria antiga e quadros a preto e branco, saímos do lado de lá, de onde se vê a ponte, de onde se vê tudo. À distância de um braço está o primeiro farol de características modernas ocidentais a ser construído no Extremo Oriente. É aqui que todos os caminhos vêm dar: as coordenadas geográficas de Macau estão definidas com base na localização exacta do farol.
A fortaleza é de 1622 e defendeu a cidade dos holandeses. Hoje, não testemunha lutas armadas, mas nem por isso perde a sua aura protectora. Aqui se erguem os sinais de tufão e a bandeira verde-esperança que dá cor à complexa identidade de Macau. Para aqui vêm não só turistas, mas caminhantes que procuram perspectiva, uma visão panorâmica da cidade e da vida, um lugar onde os carros não se ouvem e a paisagem convida à leitura. Quem busca sempre alcança.
Para baixo todos os santos ajudam, mas isso é na Europa. Aqui, na China de Macau, os santos (ou seja lá o que forem) apenas nos lembram, a cada degrau descido, que devíamos voltar para cima o quanto antes.
Coisas surreais que me acontecem em Macau - devia criar um rubrica para isto
segunda-feira, 10 de outubro de 2011
domingo, 9 de outubro de 2011
Ser independente é...
Ontem...
sábado, 8 de outubro de 2011
sexta-feira, 7 de outubro de 2011
Not under the stars...
quarta-feira, 5 de outubro de 2011
terça-feira, 4 de outubro de 2011
A idade
Passos em volta: Os dois
Já amanhecia e a conversa continuava. Daquelas conversas que só se têm no lusco-fusco, com um par de cervejas na mão e os olhos a arder de cansaço.
Ali, perante aquela vista de filme que é o lago Nam Van, a água, a ponte, a torre, as luzes reflectidas em espelho, uma pequena ilha verde no meio – não estivesse lá e diria que se tratava de Photoshop – foi quando percebi que não estava sozinha.
Ir “para os lagos”, como oiço dizer, não é coisa diurna. De dia é bonito, certamente, mas de noite é muito mais que isso. É o respirar fundo que indica o fim da semana, é o local onde se fazem planos optimistas para os dois dias que se seguem (planos raramente cumpridos em pleno) e é onde eu me sento no muro, paro o cérebro, falo, oiço falar, e sinto que afinal Macau também pode ser o meu lugar.
Mas voltemos à história. Os pés balançavam-me pendurados sobre o lago. Ao meu lado, a mala mais cara do mundo – falsificada. Ele, personagem de séries infanto-juvenis, ela, uma neurótica das mais adoráveis. Pelo menos é o que eles dizem. Eu só me rio. Rio e olho para aquela vista irreal. Rio e apercebo-me que estou aqui, na outra ponta do mundo, mas com gente que surpreendentemente me parece familiar. Torço o pescoço e orgulho-me de verificar que já sei onde estou. Não que isso interesse naquele momento, o que importa ali é a imagem de poster e as pessoas que falam.
Falamos de amigos, de raízes, de despedidas, de encontros, do que é estar em casa. Gosto sempre de quem tem dúvidas, de quem não sabe, como eu, exactamente o que está a fazer. Os pensadores, desterrados e confusos, dão-me uma certa fé na humanidade. Principalmente se forem pensadores, desterrados e confusos que gostam de beber cervejas às cinco da manhã de frente para um lago no meio de uma cidade, na ponta de um país onde as pessoas têm limitada visibilidade lateral – ou pelo menos é essa a teoria.
Quando os pássaros abriram de rompante naqueles chilreios, percebi que era dia. Os velhotes começaram a chegar para os seus exercícios matinais e os carros voltaram à circulação. A cidade voltava a ser real, das pessoas que dormem de noite e vivem de dia, das pessoas que jantam em casa e depois vêem um filme.
E foi aí que eu olhei para aqueles dois, agora já sem o escurinho confortável, já sem desculpas de conversas de meia-noite (esta expressão está tão desactualizada), e senti pela primeira vez neste continente aquilo que já tinha sentido noutros pontos do mundo: não estamos sozinhos enquanto tivermos alguém a quem podemos dizer aquelas coisas de frente a um espelho de água. Não importa se nos conhecemos há uma semana, um mês ou um ano. As amizades não se fazem de calendários. Fazem-se de madrugadas em Nam Van.
Passos em volta: Quatro candeeiros
São três que na verdade são quarto. E, como em tudo na vida, um destaca-se, eleva-se acima dos outros que são mais e de menor tamanho.
Aqui, onde as ruas desembocam, um círculo marca a reunião, como se do centro do universo se tratasse (não vale deixar-se enganar pelo tamanho porque o universo, toda a gente sabe, é à medida da varanda de cada um).
O largo dos Três Candeeiros, com o respeitoso nome de Rotunda Carlos Maia, faz parte do circuito alternativo da cidade. Se és turista vais ao Leal Senado; se vens para ficar, vais aos Três Candeeiros. E o conselho, logo de seguida, vem com a advertência: ‘Olha que na verdade os candeeiros são quatro’. O mistério ninguém sabe explicar e de resto também prefiro não saber.
Não quero ser turista, quero ser de cá, contornar as pessoas na rua à velocidade da luz, saber comer de pauzinhos e reclamar dos táxis. Por isso vou aos Três Candeeiros.
Entro pelo mercado de rua adentro, onde patos assam no espeto, ao lado de toalhas de praia, flores, vestidos e peixinhos de aquário. E pela primeira vez não me parece que não falo a língua. O cantonês escapa-me, mas a linguagem de uma feira é igual aqui, em Portugal ou na Venezuela. A dona da tendinha convence a cliente de que aquela camisola de lantejoulas, folhos e flores lhe fica bem a valer. A fruta está cara – está com certeza a roubar no peso! –, e no ‘ta pau’ não ponha picante, se faz favor – perdão, ‘m’goi’, que isso já sei dizer.
Bóias para crianças, jóias, talismãs, sumos, chaves, roupa interior. ‘Underwaist’, não se deixe enganar, é loja de fatos de banho. Mas se quiser roupa à medida, também se arranja e um “seja bem-vindo a esta Alfai Ataria” assim o prova.
Viro para a esquerda, viro para a direita, faço ziguezague por entre as donas de casa, entre o peixe seco, a carne a quilo, e as frutas pontiagudas – se soubesse tudo também não teria piada, não é? Por vezes o mistério ajuda a manter o encanto das coisas.
Um senhor careca, de bandolete preta (wishful thinking?), remexe ao lume uma mistura que não reconheço, mas arriscava dizer que é carne. Ao lado, folhas de bananeira dobradas em almofadinhas escondem um recheio promissor. Ele olha-me esperançoso, sorri, aponta para a mágica caixa de esferovite mas eu aceno que não. O dia avizinha-se longo e guardo as aventuras gastronómicas para o fim-de-semana.
Macau que é tão português, na calçada, nos pastéis de nata, nos nomes das ruas e nos restaurantes, aqui não existe. Mulheres sentadas no chão falam alto e riem. Há ovos de três ou quatro cores diferentes, frutas e vegetais que, se já comi, não dei conta. Montras com aparelhos domésticos vendem maquinetas que nem imagino para que servem.
O relógio dá-me pressa e eu lamento. Nos Três Candeeiros fica-se uma tarde, a espiolhar, remexer, cheirar, provar. E sempre, sempre, a gesticular. Porque afinal, eu ainda não sou daqui.