Mas tem que ser. Não porque tenha alguma obrigatoriedade em manter um blog, mas porque escrever me ajuda a manter a sanidade e porque é uma via de comunicação com um punhado de amigos muito queridos e que pouco ouvem de mim. E porque Macau merece, caraças, merece! Este sítio é de outro mundo. E se eu conseguisse explicar isso, seria maravilhoso.
Há uns dias o meu prédio entrou em obras. Uma barulheira infernal daquelas que ninguém que se deitou às 4 da manha (e não foi para beber copos) merece. Algumas vezes me tocaram à campainha - cuja música é sempre diferente e é sempre uma canção qualquer, como em todas as campainhas para estes lados - mas eu, de pijama e a tentar manter-me no mundo dos sonhos, ignorei. Um dia, já estava de banho tomado e vestida, tocaram de novo. Abri. E a apartir daí não tive qualquer controlo sobre o que se passou.
Patati patata, pim pim, pototo, senhores das obras, umas senhoras de aspirador na mão, muito falam e gesticulam, eu só digo "sorry, sorry, just english". Entram-me pla casa a dentro, escadote, ferramentas e tudo o que é preciso, e começam a furar-me a parede. Bom, mais precisamente o quadro eléctrico (parece seguro, nao parece?). Eu às tantas desisto de perceber o que se está a passar e continuo a almoçar, agora com um saborzinho a pó de pedra. Nham! A certa altura a luz vai abaixo, eu levanto a cabeça, o senhor lá continua em actividades potencialmente perigosas e eu 'ok, vou lavar a loiça'. Quando regresso o homem tinha-se sumido, a luz voltou, mas posso ter aqui uma bomba instalada em casa que nunca saberei (bom, até ao dia).
Esta foi a bizarria Macau da semana. Dessas do dia-a-dia. Depois, a grande Lusofonia! (rimei e tudo!)
Este fim-de-semana aconteceu em Macau, como acontece todos os anos, o Festival da Lusofonia. Uma espécie de Santos Populares, em que uma zona antiga da cidade é toda decorada com barraquinhas dos países CPLP, com um palco ao fundo onde bandas dos vários países actuam. É o gathering de todos os falantes de português, de Timor a Goa, Angola, Moçambique, Brasil, por aí fora. Literalmente toda a gente está lá. Se quisessem eliminar-nos era pôr uma bomba na Lusofonia.
O espírito é do melhor, as caipirinhas são más mas voam a uma velocidade estonteante, e nesse dia toda a gente tem samba no pé e ensaia uns passos de funaná. Nesse dia também se encontram entrevistados, desses engravatados e sérios, que na Lusofonia são todos abraços, já trocam as letras e dizem o que não devem. A Lusofonia tem muito amor para dar.
Eu fui aos dois dias possíveis, sexta e sábado. Ontem consegui finalmente encontrar-me com uma jornalista da Renascença que veio de Portugal em reportagem. Ela estava maravilhada. Dizia "isto é surreal, estar na China e ver isto!". E nós sorrimos. E depois sorrimos um pouco mais porque com os dias que passam, com o stress, as corridas, as noites mal dormidas, não tempos tempo para dizer que de facto isto é surreal. As famílias de chineses a cantarolar "Ó malhão, malhão", a misturada de gente de países que falam como nós mas que são tão, tão diferentes. O assessor do Governo que me chama Santinho e anda de all stars.
Macau é isto. É a Amélia que na verdade tem um nome chinês que eu não consigo fixar, que é de Tsingtao (sim, da terra da cerveja!) mas fala português quase como eu, diz "não quero puxar a brasa à minha sardinha" e ouve a Rádio Macau portuguesa. Macau são todas as coisas improváveis numa só. É estar a ouvir a emissão em directo da rádio e a pensar como é um luxo ver isto tudo de perto e como não é em todo o lado que se encontram pessoas que dão tantas gargalhadas a trabalhar.
Como dizia a Maria João, isto é mesmo surreal. Ela, que roubou ao sono horas para conhecer a cidade fora dos casinos, perguntava onde podia ir a seguir. E a gente disse, desenhou mapas e soletrou enigmas para dizer ao taxistas. Não sei se ela ontem chegou ao Xexe, mas tenho a certeza que se não o fez, foi porque foi parar a um sítio ainda melhor. Porque Macau é assim.
2 comentários:
ahahah
Chineses a cantar o malhão. Quero muito registos disso.
o teu melhor post, talvez o teu melhor momento. Reflexo de qualquer coisa*
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